Pierre León
Divulgação
Com o tema “Cinema de Urgência”, o CineBH procura debater o instável e arrasado cenário político e econômico brasileiro. Um dos filmes a remexer o barril de pólvora é Operações de Garantia da Lei e da Ordem, de Julia Murat e Miguel Antunes Ramos, exibido em cópia ainda não finalizada (work in progress).
Ainda assim, o filme já se destaca como um trabalho mais elaborado de observação e certo grau de detalhamento de certas situações relacionadas às manifestações populares recentes.
Desde a deflagração dos movimentos sociais de 2013, muitos realizadores vêm se debruçando sobre uma infinidade de imagens, da mídia hegemônica ou alternativa, produzidas sobre as manifestações e seus desdobramentos, especialmente focados nos confrontos das ruas.
A dupla de diretores prefere contrapor as formas de enquadramento de determinados casos emblemáticos, tais como a morte do cinegrafista Santiago Andrade, em relação à mídia massiva televisiva e os canais alternativos na web. Existe todos um cuidado em apurar o que está por trás dessas inserções midiáticas, apesar do filme claramente se posicionar ao lado desses últimos grupos.
No jogo de espelhos que o longa promove, as manifestações acabam se tornando um objeto de estudo que mais tensiona a manipulação midiática do que necessariamente as discussões em relação ao próprio movimento de revolta.
Correlações
Em consonância com o tema, o CineBH exibiu o documentário Videogramas de uma Revolução, de Harun Farocki e Andrei Ujica. O filme é já um clássico do cinema documental que aborda as manifestações populares que tomaram as ruas da Romênia quando da deposição do ditador comunista Nicolau Ceausescu no final doas anos 1980.
Os manifestantes acabaram tomando o controle da estação de televisão estatal na capital do país, Bucareste, e passaram a exibir, em tempo real, a cobertura da revolução que tomava as ruas naquele momento. O filme é um forte estudo sobre o poder midiático e a necessidade de ocupação de espaços hegemônicos de fala para circulação da informação.
Não é à toa que também houve exibição do curta mineiro Na Missão, com Kadu, de Aiano Bemfica, Kadu Freitas e Pedro Maia, com um gosto amargo: o filme aborda a luta do líder de uma ocupação da região periférica de Belo Horizonte.
O embate entre manifestantes e policiais é desigual e o desfecho é dos mais impactantes. Em tempos de tantas arbitrariedades políticas, as lutas populares têm ganhado muito destaque na mídia, e esses filmes participam da luta buscando entender o que essas imagens podem significar e suscitar.
Pierre Léon
Homenageado desta edição do CineBH, o cineasta francês Pierre Léon está no Brasil para exibir e conversar sobre sua obra tão pouco conhecida no país. O primeiro de seus filmes exibidos foi a adaptação da peça do escrito russo Anton Tchecov, Tio Vânia, que ele realizou no final dos anos 1990.
“Eu sempre fui um grande leitor. Eu sou mais interessado na música, na pintura, mas no fundo é tudo a mesma coisa. O que me interessa mesmo é a imagem, independente de onde ela esteja”, provocou o diretor durante a master class que ministrou aqui.
O cinema de Pierre Léon, como pode ser visto também no seu primeiro longa-metragem Duas Damas Sérias (1988), tem inspirações muito teatrais, com evidente destaque ao texto que provém ou que possui forte influência da literatura.
Léon também defendeu a artesania simples de suas obras. “Meus filmes são modestos, feitos sem pressão”, disse. Há de fato mais preocupação na mise-en-scène do que na técnica, especialmente na textura desgastada da imagem. Mas Léon faz um cinema que defende muito bem seu modo “amador” de contar histórias.
*O jornalista viajou a convite da organização do festival