Loja do projeto The Street Store foi inaugurada neste sábado
Cleonice Maria Costa tem 53 anos de vida e dez vivendo nas ruas de Salvador. Nesse período, teve seis filhos - cinco mulheres e um homem - e mandou três deles para morar no interior com a família. Ontem, durante a primeira edição do The Street Store, na praça das Mãos, no Comércio, ela esqueceu os problemas por um momento. Pôde escolher as roupas e calçados que queria, como se estivesse em um loja de shopping.
A iniciativa, inspirada em um projeto originado na África do Sul, durou o dia todo. Além da distribuição de roupas, teve oficinas de brinquedos com criança em situação de rua e atendimento de funcionários da Defensoria Pública do Estado da Bahia (DPE-BA).
Uma das organizadoras do projeto em Salvador, a estudante Emanuelle Ferreira explica que a ação acontecerá periodicamente, mas de forma itinerante, em outros espaços da cidade, como praças e bairros pobres.
Em campanha de arrecadação durante três meses, o grupo coletou, para a ação de ontem, cerca de quatro mil peças de roupas e aproximadamente 500 pares de calçados.
Para Cleonice, o projeto ajuda pessoas como ela a resistir mais um pouco e ter esperança. "As pessoas não estão aqui porque querem. Eu queria uma vida boa, um lar para descansar, ter comida na hora certa", disse à equipe de A TARDE. "As pessoas acham que morador de rua é vagabundo, mas eu nunca matei, nunca roubei, em dez anos de rua só fui drogada", desabafou.
Membro do Movimento Nacional da População de Rua (MNPR), Maria de Lourdes Silva, 54, elogiou a realização do The Street Store. Para ela, o ato da doação sinaliza a preocupação e o cuidado com o próximo.
"Não tenho dúvida de que é melhor doar do que deixar sem uso em casa. As pessoas em situação de rua precisam daquele objeto. Elas estão na rua por problemas familiares, por falta de opção", defende a ativista, que atualmente vive de aluguel.
A situação é semelhante com a de Cleonice Maria Costa. Há alguns meses, ela aluga um quarto no Comércio a R$ 70 para não ter que dormir na rua com as filhas e o neto David Cauã.
O dinheiro, ela ganha vendendo água e cerveja na região do Comércio. Ao falar da época em que tinha que catar lixo para se alimentar, Cleonice se emociona.
"Eu catava lixo pra não morrer de fome, tinha muita covardia na rua, meu marido me abandonou. Eu sou uma pessoa muito cansada, muito cansada. Bebo umas cervejas pra esquecer, porque não dá pra aguentar", diz, entre lágrimas.