Para Solange, criar peças de decoração era terapia, agora tornou-se ocupação
Transformar o desperdício em ações voltadas para o reaproveitamento de matérias-primas em potencial utilidade é vital para a conservação do meio ambiente. Mas, muito além da preservação da natureza, atitudes sustentáveis podem modificar histórias de vida. Garrafas, frascos de vidro, caixotes de madeira, tampinhas, plásticos e tudo que comumente é tratado como lixo viram arte e ação social quando caem nas mãos habilidosas de quem tem cérebro criativo e o dom de transmutar. Foi assim que o comerciante Agnaldo Modesto dos Santos, 61, alegrou a vida de crianças do município de Simões Filho.
Com materiais recicláveis coletados nas lixeiras do loteamento São Miguel e redondezas, o comerciante confecciona, há mais de 20 anos, brinquedos como carros de rolimã, bonecos e piões para crianças matriculadas nas creches da rede pública do município. Além de proporcionar à criançada o sonho de ter em mãos um brinquedo original, seu Modesto, como é conhecido na cidade, resgatou antigas brincadeiras que acabaram se perdendo com o tempo, como bate-lata, pular corda, dentre outras.
"Olhava o lixo e ficava indignado com tanto desperdício. Percebi, também, que, com o tempo, as crianças deixaram de lado brincadeiras construtivas e se voltaram para os equipamentos eletrônicos. Então, juntei o útil ao agradável", disse.
A maior parte do material confeccionado é doado aos alunos da creche Hamilton Santana, em Simões Filho. Mais que atender a uma necessidade dos alunos - muitos deles sequer têm brinquedos em casa -, os presentes despertaram nas crianças a curiosidade de aprender como elaborar os próprios objetos. Atendendo a pedidos, seu Modesto resolveu ensiná-los a montar carrinhos e bonecos de garrafa PET e rolinho de papelão. "A cada ensinamento, tenho a consciência de que estou ocupando o tempo dos garotos, que estou tirando eles de um possível convívio com o crime no futuro", disse.
Superação Se para seu Modesto o artesanato feito com bens recicláveis tornou-se uma forma de incentivar a criatividade das crianças, para a técnica em enfermagem e artesã Solange de Souza Freitas, 52, o gosto pelo trabalho com esse tipo de material surgiu como uma terapia para enfrentar um problema de saúde.
Há 12 anos, ela foi diagnosticada com um câncer de mama e viu no reaproveitamento de caixotes, retalhos de pano e itens de plástico uma maneira de não se entregar à doença e encarar o tratamento de maneira otimista.
Mesmo após a tão esperada alta médica, Solange não conseguiu abandonar o hobby. Hoje, ela mantém um pequeno ateliê em casa e confecciona objetos de decoração, como vasos, mesas e bancos feitos com papel, suportes de máquinas de costura e caixas de frutas. "Eu deixei meu emprego e comecei a fazer trabalhos manuais, usando tudo aquilo que ninguém queria, que descartava. Aos poucos, minha criatividade foi aflorando, e hoje o que as pessoas veem como lixo eu vejo como pura arte", disse.