Área na R. da Alfazema, atrás do Hiper Bompreço, está na relação de terrenos para desafetação e venda
O projeto apresentado pela prefeitura da capital baiana para desafetar – ato de tornar um bem público apropriável – e alienar [vender] 29 terrenos públicos municipais vai à votação hoje, na Câmara Municipal de Salvador, mergulhado em um mar de polêmicas.
Fomentadas pela oposição ao prefeito ACM Neto (DEM) na Casa, as divergências sobre a proposta são chanceladas parcialmente pelo Ministério Público do Estado Bahia (MP-BA), que também criticou pontos do projeto, e podem acabar em uma decisão judicial.
Ontem, um termo de ajustamento de conduta chegou a ser acertado entre a Secretaria Municipal da Fazenda (Sefaz), a Procuradoria Geral do Município (PGM) e as promotorias de Patrimônio Público e Meio Ambiente do MP baiano.
Entretanto, uma decisão da desembargadora do Tribunal de Justiça da Bahia Ilona Márcia Reis ainda poderá, até o início da sessão na Câmara, hoje à tarde, suspender a tramitação da pauta.
Márcia Reis é a responsável por julgar um mandado de segurança movido pelos vereadores Marta Rodrigues (PT), José Trindade (PSL) e Aladilce Souza (PCdoB) contra o projeto do Executivo.
R$ 82 mi
foram arrecadados pelo fisco municipal em 2015, quando outros 14 imóveis foram alienados, de um total de 59 desafetados com o aval da Câmara Municipal de Salvador
Oposição à gestão de Neto, eles pedem a interrupção do andamento da matéria até que a prefeitura apresente estudos técnicos que comprovem a necessidade da alienação dos imóveis.
Os vereadores criticam a “falta de explicações” sobre o uso dos recurso e dizem que o município “nunca explicou” como usou o dinheiro arrecadado com a venda de outros 14 terrenos, parte de uma lista total de 59 que foram desafetados em 2015, com o aval da Câmara.
Na manhã de ontem, eles se reuniram com a desembargadora, quando, conforme relato da petista Marta Rodrigues, reforçaram os argumentos da peça judicial.
Mudanças
Diante do cenário, a prefeitura retirou três terrenos da lista: parte do Vale Encantado, na avenida Tamburugy (em Piatã), e duas áreas verdes (uma na rua da Alfazema, no Caminho das Árvores, e outra na entrada de Stella Maris).
Em outros quatro casos, os terrenos tiveram os mapas redesenhados, para que áreas verdes ficassem fora da poligonal que será vendida. São eles: parte do condomínio Stella Sol, em Stella Maris, um trecho de área verde no Imbuí e outro no condomínio Pituba Ville, na Pituba.
Com isso, o projeto, que originalmente tinha uma lista de 32 imóveis, agora tenta permitir a venda de 29 terrenos do município [veja o infográfico].

A relação inclui áreas em bairros nobres, como uma que fica no cruzamento da rua da Alfazema com a avenida Paulo VI, atrás do supermercado Hiper Bompreço. O bairro mais listado, no entanto, é Piatã, com dez terrenos colocados à disposição do mercado.
Ajustes
No TAC proposto pelos promotores Rita Tourinho (Patrimônio Público) e Marcelo Guedes (Meio Ambiente), foram feitas exigências para que a pauta não fosse judicializada pelo órgão, continuasse a tramitar normalmente e, após a sanção, tivesse a alienação acompanhada pelo MP.
Entre elas, a de que os valores arrecadados só fossem utilizados para a recomposição patrimonial do município: ou seja, para adquirir outro patrimônio. A aplicação em investimentos, conforme os termos do documento, só poderá ser feita para objetivos de interesse público e social.
Além disso, de acordo com Rita Tourinho, foi exigido que os recursos fossem depositados em uma conta própria e que fosse vedada a utilização deles para custeio de despesas ou qualquer outro fim dessa natureza.
“Se o município concordar, estará resguardado [o interesse público], então não será necessário retirar o projeto”, avaliou a promotora, prometendo que, em caso de recusa, uma ação seria movida na Justiça.
Ela disse que, após as primeiras provocações, o município enviou para o órgão informações ausentes no projeto, como a justificativa para as vendas e os critérios para escolha dos terrenos que serão desafetados.
Assina
Secretário da Fazenda da gestão ACM Neto, o ex-governador Paulo Souto, sinalizou ontem mesmo que aceitaria o acordo. À reportagem de A TARDE, ele afirmou que “seguramente” assina a proposta. Após ouvir os pontos de exigências do MP, frisou que não tinha discordância com o TAC.
Segundo Souto, a resposta positiva foi dada ontem mesmo ao MP baiano pela PGM e Sefaz.
Ele afirma que o depósito dos valores em contas próprias para esse fim já é feito pela prefeitura desde a desafetação de 59 imóveis em 2015 – 14 deles já vendidos. Parte dos outros 45 imóveis, de acordo com o secretário, foram considerados não atrativos após uma nova análise da gestão.
Ele explica que a Lei de Responsabilidade Fiscal já cumpre a função de restringir a aplicação de valores arrecadados com alienação de imóveis em despesas de capital (investimentos).
E detalha que os R$ 82 milhões obtidos com o leilão dos 14 terrenos do projeto anterior foram gastos, em boa parte, com as obras do Hospital Municipal. Também foram beneficiadas com esses recursos obras nas avenidas Afrânio Peixoto (Suburbana) e Almeida Brandão.
Questionamento
Oposição diz que falta de estudos para venda de áreas é problema e vai à Justiça
Ainda conforme o secretário, cerca de R$ 31 milhões daquela alienação, ocorrida há dois anos, ainda estão “em caixa”.
O valor, explica, inclui correção monetária oriunda de aplicações financeiras feitas pelo município com os recursos.
Sem estimativas
Segundo Paulo Souto, “é impossível dizer” quanto será arrecadado com o projeto atual de desafetação, porque, diz ele, a gestão ainda não sabe quando os terrenos serão colocados à venda.
“Esse momento [da venda dos terrenos] precede a avaliação”, afirma o ex-governador, explicando que, em 2015, a previsão inicial de arrecadação foi frustrada, em parte por causa da crise enfrentada pelo setor imobiliário no país.
No projeto que será votado hoje, contudo, o município explica que a concorrência pública poderá ser feita até em duas fases.
Na primeira, as propostas serão entregues à Comissão de Licitação. Já na segunda, será uma disputa de lances, em formato de leilão.
A proposta ainda garante ao vencedor da licitação isenção de IPTU e da taxa de lixo por três anos. “Todas as vendas serão por licitação, com divulgação nacional, de forma transparente”, garante o secretário, criticando a oposição. Para ele, os vereadores fazem “cavalo de batalha” com o projeto enviado pelo Executivo.
“Ninguém aqui faz oposição só por oposição. Só queremos cumprir a lei”, rebate Marta Rodrigues.