Zelito Viana, cineasta
O produtor, cineasta e roteirista Zelito Viana esteve em Salvador a convite do Cine Futuro. Sua atuação como produtor cinematográfico permitiu uma série de trabalhos em importantes obras do cinema brasileiro. Toda essa trajetória se deve à fundação da produtora Mapa Filmes, que completa, em 2015, 50 anos de atividades prestadas ao cinema. Irmão de Chico Anysio, talvez ele seja mais conhecido por ter dirigido em 2000 a cinebiografia Villa-Lobos - Uma Vida de Paixão, com Marcos Palmeira, seu filho. Na entrevista ao A TARDE, ele fala também sobre projetos novos, como um filme autobiográfico e Mátria, que se passa na Bahia, com direção de Jom Tob Azulay.
A Mapa Filmes completa 50 anos. Como surgiu a produtora?
A Mapa surgiu através de um convite do Glauber Rocha a mim. Nos conhecemos durante uma reunião para se discutir a situação do filme Cabra Marcado pra Morrer, que estava sendo censurado pelos militares [era abril de 1964]. Quando terminou a reunião, veio um baixinho conversar comigo, com sotaque nordestino, me convidando para ser sócio dele. Glauber Rocha estava produzindo Menino de Engenho, de Walter Lima Jr. Disse que o filme prometia um bom dinheiro e queria montar uma produtora em torno dele. Quando fomos discutir o nome da empresa, Glauber lembrou da revista cultural Mapa que ele editava aqui em Salvador. E aí nasceu a Mapa Filmes.
Com quem vocês se aliaram no início?
O primeiro filme que a gente produziu integralmente foi A Grande Cidade, do Cacá Diegues. Nós o convidamos para entrar como sócio da Mapa, mas ele não aceitou. Mas pudemos contar com Paulo César Saraceni, além do Walter Lima Jr. E comecei a produzir com Glauber. Nós fizemos juntos Terra em Transe, O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro, Câncer e Cabeças Cortadas.
E como foi sua proximidade com Glauber Rocha?
Minha relação com Glauber sempre foi ótima. O pessoal o chamava de louco, mas ele não tem nada disso. Era um trabalhador incansável, um workaholic infernal. Minha única briga com ele durou umas dez horas. Ele queria que eu produzisse A Idade da Terra. Mas eu já estava em outros projetos e achava que ia dar zebra. E mesmo na relação profissional eu já não era mais o produtor que fazia tudo em Terra em Transe e nem ele era o mesmo diretor. Mais novo, ele se adaptava muito mais às exigências da produção, não naquela fase final, depois de uma projeção internacional. Mas todo o tempo em que eu trabalhei com ele foi superprazeroso.
Nessa fase inicial, era mais fácil produzir por conta da efervescência do Cinema Novo ou mais difícil por ser o período da Ditadura Militar?
A partir do AI [decretado em dezembro de 1968] que realmente ficou muito difícil. De 1964 a 1968 foi uma época muito frutífera para o Brasil, porque você tinha a Ditadura, mas todo mundo querendo resistir contra aquilo. Ao mesmo tempo o regime não tinha adquirido aquele caráter sanguinário que viria a apresentar. Era uma época muito rica não só para o cinema, mas também para o teatro e a música brasileira. Já existia censura nessa época, mas ela é intensificada mesmo com o AI5. E as pessoas foram se autocastrando também. Eu coproduzi Os Inconfidentes (1972), de Joaquim Pedro de Andrade, e quando nós exibíamos para os amigos e intelectuais, todos afirmavam que era loucura produzir o filme e que não ia passar pela censura nunca. E o filme foi lançado sem nenhum problema.
Um filme mais popular também foi Máscara da Traição, do baiano Roberto Pires.
Sim, e foi um filme que rendeu muito dinheiro, um grande sucesso de bilheteria. Acredito que é o filme que mais nos rendeu lucro. Eu chamei o Roberto pra fazer a produção de O Homem que Comprou o Mundo, do Eduardo Coutinho, e ele era muito amigo do Glauber. E nos veio com a ideia de fazer um filme sobre um assalto no Maracanã. Roberto era um profissional, mas com mão leve. Um grande artesão.
E como foi finalizar Cabra Marcado pra Morrer?
Eu entrei na produção do segundo momento do Cabra. O Coutinho era totalmente obcecado pelo filme. Ele trabalhou muito em outros projetos, mas só pensava em terminar o Cabra. Quando Carlos Augusto Calil foi para a presidência da Embrafilme, surgiu a possibilidade de conseguir dinheiro pra terminar o filme. Então Coutinho me procurou, a gente era muito amigo e já tínhamos trabalhado muito antes. E o filme se tornou um evento.
E você está com projetos novos?
Sim, eu vou fazer um filme chamado Sedução que tem algo de autobiográfico, mas é totalmente de ficção. É um projeto que está me perturbando a cabeça e preciso botar pra fora. E estou produzindo um filme que vai se passar aqui na Bahia chamado Mátria, a ser dirigido pelo Jom Tob Azulay [diretor do clássico Os Doces Bárbaros].