Ministério da Justiça instaurou, somente este ano, 14 inquéritos contra empresas
MARJORIE MOURA
Se você não pediu um cartão de crédito através de folhetos, por telefone ou pela internet a nenhum banco, financeira, loja ou qualquer estabelecimento, não existiria motivo para receber um deles, certo? Certo, mas essa norma não vem recebendo a devida atenção por parte das empresas administradoras de cartões, que continuam a enviar serviços e produtos não solicitados. Não é à toa que desde o início deste ano o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), do Ministério da Justiça, instaurou 14 inquéritos administrativos contra algumas destas instituições.
Os processos administrativos atingem administradoras de cartões de crédito e a Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs). Cinco processos são contra a Fininvest, três contra o Unibanco, três contra a Credicard, um contra a Caixa Econômica Federal, um contra a Itaucard e um contra a Real Administradora de Cartões e Serviços.
As empresas são acusadas de descumprir um termo de ajustamento de conduta (TAC) firmado em dezembro de 1998 entre o DPDC e a Abecs, em nome das administradoras de cartões de crédito. Pelo termo assinado, havia o compromisso de não enviar cartões de crédito aos consumidores sem que tivessem sido solicitados. As oito denúncias foram feitas por consumidores e por representantes de órgãos públicos.
A multa prevista no termo de ajustamento de conduta por descumprimento é de 500 mil Ufirs.
Com a decisão, o TAC será declarado extinto, o que significa, que se estas empresas forem processadas novamente pela mesma prática, serão aplicadas as multas previstas no Código de Defesa do Consumidor, que variam de 200 a 3 milhões de Ufir (entre R$ 212 e R$ 3,19 milhões).
ABUSO R.C.S. se considera uma vítima desta prática e diz que não agüenta mais receber ofertas de crédito, mas até o momento não sabia como proceder para evitar este tipo de abuso. Somente nos últimos meses de 2005, foram enviados para sua residência cartões do Cetelem, Panamericano (internacional) e Ipiranga.
O que mais irrita é que o tal do Cetelem mandou um folheto agradecendo a preferência e dizendo que eu pedi o cartão! Nunca ouvi falar desta empresa e nem sei como eles conseguiram os meus dados, protesta. Além deles terem acesso a dados que deveriam ser sigilosos, como meu nome completo, endereço e CPF, corro o risco de que um desses cartões se extravie e algum ladrão comece a comprar em meu nome. E aí, o que é que eu faço?, indaga, preo-cupada.
Essa é a pergunta feita por vários consumidores, segundo o Procon-SP, que prestam queixas declarando que as atendentes das empresas telefonam pedindo para confirmar os dados cadastrais. De acordo com o órgão de defesa do consumidor, as empresas financeiras e bancos são interligadas com lojas e supermercados. Se a pessoa fez compras a prazo num estabelecimento deste tipo, seus dados poderão ser acessados.
Inicialmente é preciso saber que todo produto enviado ao consumidor sem ele pedir é considerado amostra grátis, como ressalta o Código de Defesa do Consumidor, quando trata das práticas abusivas. É proibido ao fornecedor de produtos ou serviços enviar ou entregar ao consumidor, produto ou fornecer serviço sem solicitação prévia (Artigo 39º).
Se o consumidor desbloquear o cartão, isto não significa dizer que consente o seu uso. Mas, se pagar a fatura onde consta a anuidade, fica convencionada a aceitação. E, se acumular fatura, poderá ter o nome inscrito nos cadastros do SPC (Serviço de Proteção ao Crédito) e Serasa. Caso sejam emitidas faturas de cobrança (anuidade, cartão adicional) que possam acarretar prejuízo ou dano, é cabível uma ação pedindo indenização por perdas e danos.
Fique atento a seus direitos
Cada vez mais utilizados no Brasil, país onde até o final do ano deverão estar em circulação 390 milhões de cartões, este instrumento de crédito costuma facilitar a vida das pessoas. Mas, se o consumidor não estiver atento, o cartão pode se transformar numa fonte de problemas. Juros altos e cobranças indevidas lideram a lista de reclamações. Mas evitar prejuízos também depende de cuidados por parte dos usuários.
Segundo o Procon-SP, se o consumidor estiver viajando e atrasar o pagamento da fatura de cartão de crédito, é preciso verificar se a operadora cobrou juros retroativamente à data de vencimento da fatura. Segundo parecer da Justiça, o correto seria que os juros só fossem cobrados a partir do primeiro dia útil após o vencimento.
No caso de cobrança indevida, se o consumidor não concordar com um lançamento incluído na fatura, deve entrar imediatamente com pedido de revisão dos lançamentos junto à administradora do seu cartão. Também é preciso atenção quando a administradora de cartão pertence a um banco e o valor mínimo da fatura ou dos encargos relacionados ao atraso do pagamento for debitado em sua conta corrente ou poupança. Esta prática é permitida se for autorizada por escrito pelo cliente.
Se isso não tiver sido feito, o correntista tem direito a pedir cancelamento da cobrança. E se o débito feito sem autorização causar a devolução do cheque do cliente, caracterizando inadimplência e possível inclusão de registro no Serasa, é possível considerar uma ação por danos morais e materiais. Se, apesar de notificada, a administradora não realizar o estorno dos valores indevidos, o caminho é entrar com reclamação formal junto a um dos órgãos de defesa do consumidor.
O Código de Defesa do Consumidor garante o direito a um extrato detalhado informando todos os gastos e cobranças, que permite checar uma eventual falha, como também a exigir o ressarcimento em dobro da parcela paga indevidamente (Art. 42º).
Maioria prefere usar dinheiro
O cartão de crédito completa 50 anos de Brasil em 2006 e a estimativa é que até o final do ano sejam 390 milhões de unidades circulando no mercado, num aumento de cerca de 15% em relação a 2005, prevê a Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs). Em 2005, 337 milhões de cartões movimentaram R$ 211 bilhões. Fatores como o crescimento da economia e o aumento de estabelecimentos credenciados a aceitar esta modalidade de pagamento devem ampliar o volume movimentado para R$ 261,8 bilhões, um crescimento de cerca de 24%.
Mas, de acordo com estudo que a Abecs está finalizando, o crescimento do uso do cartão resultou também em elevação da inadimplência. A entidade não divulga números, mas informa que nos últimos seis meses a expansão do crédito e da emissão dos cartões resultou no endividamento dos usuários. O principal desafio, segundo a Abecs, não é o cartão substituir os cheques, mas sim o dinheiro. Em 1995, do total de pagamentos no Brasil, 7% eram com cartões, 26% com cheques, 55% com dinheiro e outros 12% se referiam a outras formas de pagamento. Dez anos depois, a participação dos cartões havia subido para 20%, a dos cheques caiu para 14% e a do dinheiro ficou praticamente estável, em 53%.
DICAS PARA EVITAR COBRANÇAS FUTURAS
Faça uma correspondência à empresa que enviou o cartão, de preferência por carta registrada, declarando que não pediu, nem quer o cartão.
Incinere o cartão (ao cortar com a tesoura, os pedaços podem ser reunidos).
Ao ligar para a empresa, não digite o número do cartão que recebeu, da carteira de identidade ou CPF, porque isso desbloqueia o cartão.
Se a ligação não lhe dá outra opção para falar com o atendente, desligue, vá a um órgão de defesa do consumidor e peça uma orientação.
Se você desbloqueou e recebeu a anuidade, não efetue o pagamento: ligue para a empresa ou escreva dizendo que você não quer o cartão.