Formado em arquitetura, o atual diretor-geral da Via Célere na Bahia, Rodrigo Dratovsky, aceitou, em 2008, com apenas 28 anos, o desafio de ser gerente de incorporação da empresa. Recém-chegada ao Brasil, a incorporadora espanhola aproveitou o boom imobiliário nacional e instaurou uma estratégia agressiva para ganhar mercado, com a compra de terrenos e lançamentos expressivos. Nos últimos anos, lançou prédios em bairros como Barra, Pituba, Horto Florestal e Jaguaribe. "A gente sempre tentou ser inovador desde a compra do terreno, ao buscar áreas de crescimento", afirma Dratovsky. Nesta entrevista, o executivo, que passou à direção após a saída de Fernando Pijoan, conta sobre a trajetória de crescimento e dos desafios de ser um gestor jovem em um ramo tradicional.
Como a Via Célere começou?
Em 2007, o presidente da Via Célere (o espanhol Juan Antonio Gómez-Pintado), vendeu a empresa que ele tinha há 25 anos de mercado. Ainda se vendia muito na Espanha no início de 2007, mas no meio do ano ele recebeu uma oferta de compra da empresa. O valor na época era uma proposta irrecusável. Ele também viu que estavam vendendo muitos imóveis sem lastro, o que acabou acontecendo com a crise espanhola. Eram refinanciamentos, a pessoa comprava e refinanciava a dívida, com mais tempo, mais prazo. Não terminavam de pagar e, às vezes, pegavam mais dinheiro emprestado para fazer uma reforma, para comprar um segundo apartamento. Ele viu que esse mercado não estava bem lastreado. Então, ele vendeu. No final de 2007, estourou a crise europeia e ele vendeu a empresa de porteira fechada. Após isso, abriu a Via Célere, com o intuito de não fazer mais empreendimentos naquele momento na Espanha e apostar em novos mercados, mercados emergentes. Foi aí que ele contratou meu chefe na Iberostar, o Fernando Pijoan. Ele me convidou três meses depois para participar desse projeto aqui no Brasil. Fernando Pijoan era diretor internacional, como era também na Iberostar, e me convidou para procurar negócios aqui no Brasil. Foi aí que, em abril de 2008, a gente começou o negócio da Via Célere aqui na Bahia.
A empresa apostou em outros mercados ou só no Brasil?
Começou aqui e em outros mercados, como no Leste Europeu, na Polônia e no México. No México não foi para a frente, mas chegou a montar escritório, mas eles acharam que não valia. Agora teve novos negócios também na Romênia. Essa era a ideia. Só no México não foi para a frente.
Por que a Via Célere escolheu a Bahia para começar os negócios no Brasil?
Primeiro, o presidente já visualizava um potencial de crescimento muito grande no Nordeste, com menos concorrência e mais poder de crescimento. E foi o que aconteceu. O Nordeste cresceu mais do que os outros estados e regiões. E o segundo fator foi a nossa expertise, tanto o Fernando Pijoan quanto eu, eu sou carioca mas já moro aqui há 25 anos, a gente já conhecia o mercado local. E aqui a gente achava que era uma porta de crescimento para o Nordeste. O que acabou acontecendo em Aracaju. Chegamos quase a fechar negócios em Fortaleza, mas recuamos. Em Recife também fizemos alguns contatos. Mas não conseguimos atingir todo o nosso planejamento, por toda essas pequenas crises. A crise europeia não atingiu a nossa empresa, apesar de sermos uma empresa espanhola, porque a empresa anterior de Juan Antonio Gómez-Pintado foi vendida. Nós temos uma liquidez muito boa. A gente não precisou de investimentos de grupos estrangeiros, foi tudo investimento local, com o aporte que foi feito com a venda da empresa. O restante foi com financiamentos locais mesmo, com bancos da praça brasileira.
Vocês atuam no mercado de Salvador e Aracaju. Há possibilidade de expansão para novas cidades?
Hoje, não. Desde o início, em 2010, a gente começou o processo de expansão. Eu viajei para todas as capitais do Nordeste, algumas capitais do sudeste e do centro-oeste buscando novos negócios e novos mercados. Mas desde 2010 que a gente está sofrendo com pequenas crises. Primeiro foi a crise internacional, que afetava o mercado aqui. Quando a gente lançou os nossos empreendimentos se falava de crise europeia, de crise nos Estados Unidos, e parou-se de vender aqui. A gente sempre vai para a frente, pesquisa e recua por causa do mercado. E agora, realmente, a gente acha que não é o momento de expansão. É o momento de concentrar ainda, de voltar ao que a gente fez no início, com empreendimentos menores, bem localizados. É concentrar um pouco mais porque nós tivemos que reduzir um pouco da equipe neste ano, por causa da redução da atividade. Nós reduzimos a equipe de escritório em 20%. A equipe de obras foi reduzida em quase 100% com o término das obras.
A Via Célere tem uma história recente no mercado. E você também é um gestor novo, que conhecia o mercado, mas à frente da operação ainda era uma novidade. Qual foi o seu maior desafio nesse cenário?
Foi bastante desafiador. Até porque eu já estava em um projeto bem interessante na Iberostar, sobre um novo mercado, em uma empresa já consolidada. Foi desafiador. Na época da proposta eu tive que pensar bastante antes de decidir. Mas na minha vida eu sempre gostei bastante de desafios. Passei oito anos na Iberostar e já completei sete anos na Via Célere. Gosto de desafios mas gosto também de me aproximar bem da empresa e me fidelizar na empresa. Ser jovem também foi um desafio. Em 2008, eu tinha 28 anos. Então foi um desafio grande. Eu era o principal na cidade, tinha Fernando Pijoan, mas ele sempre estava em viagens. Então, praticamente a principal pessoa da empresa na época era eu. Era desafiador desde a compra de terreno. A gente fez negociações de terrenho de R$ 14 milhões, em Jaguaribe, de R$ 6 milhões... Eu já senti o peso da responsabilidade. Entre as pessoas do mercado não senti tanto por ser jovem, porque eu já conhecia as pessoas, já trabalhei muito na área, mas para o público de fora já percebi algumas caras de surpresa. Já senti isso algumas vezes. Desde a compra de terreno há clientes que desejam conversar comigo.
O mercado imobiliário de Salvador foi paralisado pela judicialização do PDDU e do Louos. Como isso afetou os negócios da empresa?
Em 2011, a gente estava com cinco empreendimentos, com obras, vendendo. Estávamos com todas essas obras de vez, e o imbróglio do Plano Diretor atrapalhou muito. Antes da aprovação, a gente comprou dois terrenos . A gente participou de audiências públicas, nós sabíamos quais eram os vetores de crescimento, e fomos prospectando os terrenos que iam se potencializar em função do Plano Diretor. E foi uma surpresa muito grande. O Mansão Ipiranga não foi afetado, mas o Première Jaguaribe, na orla, foi bastante afetado. Por uma cláusulas mal redigidas do Plano Diretor, por ele ter sido feito às pressas. O Ministério Público achava que o nosso empreendimento não estava de acordo com a lei. Mas superamos isso e o poder judiciário já analisou e decidiu que estava tudo "ok". Já está pronto, com gente morando, graças a Deus. Mas durante esse período a gente sofreu bastante.
Como é que isso afetou os novos negócios?
Nós temos outros terreno do lado do Première Jaguaribe que até hoje não podemos lançar por causa da paralisação do Plano. Afetou na questão de credibilidade do mercado também. No meio da obra, o Ministério Público disse que não poderia construir, que era para derrubar o empreendimento. Nós estávamos com 90% do empreendimento vendido. A gente comprou o terreno antes, mas só conseguiu aprovar depois. Nós lançamos e 2010 e em 2011 estourou esse problema do Plano Diretor. A gente estava no meio do processo. Nós vendemos 90% do empreendimento em três meses. O mercado estava super aquecido. A gente na verdade não vendeu todo para fazer uma reserva de mercado, não vender 100% para ganhar um pouco de preço no final. Mas a gente sofreu bastante, a obra ficou paralisada um mês na época. E fora a insegurança. Quem é que queria comprar um empreendimento que estava sob júdice, que poderiam decidir por derrubar? Afetou diretamente. Na época que teve esse problema e a Via Célere ficou até conhecida por estar com esse problema. Foi um desafio também. O bom da gente é que compramos os terrenos em 2009 e aprovamos quase todos em 2009. Então, a gente não sofreu tanto com aprovações. Foi aprovando e lançando pouco a pouco. Mas a gente comprou o terreno no Cidade Jardim há dois anos, em 2013, e até hoje não lançamos, também por causa do problema do Plano Diretor. Porque a legislação não estava clara. Os próprios fiscalizadores, os próprios legisladores, não sabiam qual lei usar. Uma lei foi revogada, era preciso voltar para antiga, então essa transição foi complicada. Em 2013 e 2014 praticamente não se aprovou projeto em Salvador. E também houve o aumento do IPTU. O que aumento no IPTU foi o VUP (Valor Unitário Padrão) dos terrenos. Quando aumentou o VUP, a outorga onerosa, que é o valor pago para construir mais no terreno disparou. Praticamente foi o triplo do que a gente tinha viabilizado com o terreno. A gente comprou o terreno com uma outorga onerosa "x" e, de repente, foi para "3x". Realmente também inviabilizou vários projetos. O do Cidade Jardim, por exemplo, ficou engavetado um ano e meio. Agora que a gente começou a tirar do papel.
Em 2015, a torneira do financiamento habitacional fechou com o aumento de juros. Como a alta de juros e a restrição de financiamentos afeta o mercado e o que vocês estão fazendo para se adaptar?
Nós estamos tentando outras linhas de financiamento. A gente está estudando financiamento próprio para alguns tipos de clientes. Ou a gente empresta ou damos um prazo maior para o cliente pagar. Claro, nós analisamos a saúde financeira do cliente, com o cliente tentando fazer um financiamento direto com a incorporadora. Podemos emprestar o nosso recurso ou dar mais prazo para o cliente pagar. Também podemos vender esse recebível para uma instituição financeira ou algum fundo de investimentos. A gente já está estudando algumas parcerias neste sentido. Alongar um pouco mais os prazos já foi um trabalho nosso desde o início, com problema de atrasos de obras. A gente também sofreu com esse boom imobiliário. Todos os recursos chegaram a faltar. Na Via Célere não aconteceu na proporção que vimos no mercado, mas atrasamos alguns empreendimentos. Então, estamos aumentando o prazo da poupança para tentar se adaptar. Se o banco antes financiava 90%, o cliente tinha que pagar 10% do imóvel. Hoje, o banco está financiando 80% ou até menos, então o cliente tem que pagar de 20% a 30% do imóvel. Nós alongamos um pouco mais o prazo para que ele possa pagar esses 30% de forma mais tranquila. E também para folgar um pouco o nosso prazo de obra e não acontecerem mais atrasos.
Quais são os próximos investimentos em Salvador?
Para Salvador, é um empreendimento no bairro Cidade Jardim. O projeto está em fase final, está sendo finalizado, na fase final de aprovação. Nosso intuito era lançar ainda este ano, mas com esse movimento de mercado a gente decidiu postergar um pouco mais, está pensando em lançar no próximo ano. Esse projeto tem um VGV (Volume Geral de Vendas) de R$ 200 milhões. É um empreendimento grande para o cenário atual. São duas torres, de 34 pavimentos. Isso, na verdade, ainda pode mudar, está em aprovação, mas nossa ideia são duas torres de 34 pavimentos. É um empreendimento com volume razoável, grande para o mercado, mas são duas fases separadas. Nós vamos construir uma e depois a outra. É residencial, de três a quatro quartos compactos. O valor é entre R$ 600 mil a R$ 900 mil.