Comerciante, Nilton pedala duas vezes por semana
Há quem acredite que trabalho é trabalho e lazer é lazer. Mas pesquisas pelo mundo inteiro já comprovaram que um influencia diretamente no outro, e não é só isso: aquelas atividades de lazer feitas de forma sistemática, os chamados hobbies, podem ainda potencializar a produtividade de um profissional no trabalho.
De acordo com o estudo mais recente, publicado no início deste ano na revista acadêmica Journal of Applied Psychology, funcionários que se engajam em atividades de lazer à noite estão mais propensos a um melhor rendimento profissional no dia seguinte.
A psicóloga organizacional Adriana Munford acredita que a principal contribuição de um hobby está na "reenergização psíquica" do profissional.
"Nesse momento, lúdico ou prazeroso, é como se a pessoa ganhasse fôlego e deixasse a mente continuar produtiva, mas de uma maneira mais leve, sem aquela carga de responsabilidade de entregar resultados. O resultado do hobby é sentir-se bem", explica.
Para o comerciante Nilton Nogueira, a bicicleta tem justamente essa função. É a válvula de escape para o estresse do trabalho. A magrela fez parte de toda a infância do autônomo, mas, durante a adolescência, eles se distanciaram. Apenas em 2015, por questões de saúde, Nilton voltou a praticar a atividade e desde então não parou.
Nilton criou, junto com amigos, o grupo de ciclistas amadores Loucos por Bike, que pedala cerca de 90 km, divididos em duas noites na semana. O comerciante revela que o que o atrai mesmo é a adrenalina, mas reconhece que a atividade também contribui para que ele tenha mais paciência e disposição no trabalho. "Como fico muito tempo em pé trabalhando, essa disposição física é muito importante".
Contra o estresse
Munford explica que essa disposição sentida por Nilton está relacionada à produção de hormônios envolvidos nas atividades esportivas. "A liberação de endorfina, serotonina e outros contribuem, dando a ele muito mais energia de trabalho". Além disso, a psicóloga ressalta que a prática também possibilita um "cansaço bom, aquele que permite uma noite inteira de sono tranquilo".
Assim como a bicicleta é para Nilton, a leitura é, para a técnica judiciária Gláucia Ventura, o refúgio contra o estresse do dia a dia. A funcionária pública, que precisa lidar diariamente com prazos, tarefas repetitivas e "a energia pesada da área criminal", passou a fazer parte de um grupo de leituras, o Leia Mulheres.
Foi então que a atividade passou a ter também o significado de encontros e amizades. Mas o que Gláucia não sabe é que, segundo a psicóloga, esse tipo de hobby vai muito além: eles também estimulam a criatividade, fundamental para quem desempenha uma atividade profissional intelectual, como ela.
Diferente de Gláucia, o professor e consultor de marketing Marcel Ayres consegue enxergar as contribuições de seu hobby em sua profissão. O professor conta que sua história de amor com jogos de tabuleiro também surgiu na sua infância. Mas só na adolescência, quando passou a ter contato com "jogos mais modernos", que a atividade passou a ser um hobby. Desde então, os jogos são, para ele, além de um momento de reunião de amigos, "a possibilidade de desenvolvimento de habilidades e conhecimentos".
"Desenvolvemos a capacidade de trabalho em equipe, gestão de recursos, pensamento estratégico, memória, negociação, cálculo, percepção visual. E há ainda os que abordam temas e histórias, como a Guerra Fria, o cultivo de lavouras", exemplifica.
A psicóloga concorda com o professor e chama a atenção ainda para o estímulo da lógica e do raciocínio estratégico que os jogos oferecem e que "são essenciais para a área em que o professor trabalha". E não é só isso. Além de reconhecer as contribuições em sua vida profissional, o professor também acredita na utilidade dos jogos para seus alunos e funcionários. "Eles são uma forma de engajá-los em processos de ideação (criação de ideias), desenvolvimento de projetos e ações de marketing. E também de desenvolver habilidades para o ambiente corporativo".
Mas Adriana Munford acredita que nem todos pensam como Marcel, as empresas ainda estão despertando para a importância dessas atividades de lazer na produtividade dos colaboradores. "Em Salvador, apenas as empresas de grande porte, que têm muita inovação e condição financeira, conseguem usar isso a seu favor".
*Sob a supervisão da editora Cassandra Barteló