Acelino Freitas, o Popó, aos 30 anos já é conhecido no Brasil e no mundo pela série de vitórias colecionadas nos quase 11 anos como boxeador. No bairro periférico da Baixa de Quintas, onde morou até os 23, o pugilista que teve a infância pobre é um vitorioso e famoso pela humildade. Lá, ainda possui muitos amigos, que mantêm mesmo com a mudança drástica no padrão de vida. Trocou o casebre com apenas um cômodo por um imóvel confortável em Lauro de Freitas. Piscina, quadra de esportes, sala de ginástica e quarto de troféus compõem a nova residência, onde mora com a esposa Eliana e o caçula dos seis filhos, Popozinho.
Hoje, meu banheiro é maior do que casa que vivi quando era jovem. Antes não havia sanitário e a divisão dos cômodos era feita com uma cortina. Ficávamos entre os ratos. Eram muitos. Cada um enorme. Decidi dar uma vida melhor à minha família e foi confiando no dinheiro que ganharia numa luta que comprei um imóvel fiado. Venci e adquiri uma casa na Cidade Nova por R$ 27.000, conta o lutador.
Engordou a conta bancária, colecionou títulos importantes, bateu o recorde de 28 nocautes e depois o superou, chegando a 29 lutas e 29 nocautes seguidos, viajou para vários países, mas continua o mesmo Popó dos tempos que pegava lixo na porta dos vizinhos para ganhar uns trocados: brincalhão, simples e popular. Ele é igual em qualquer lugar, trata o presidente da república e um menino de rua sem distinção, observa o amigo e sócio, Josafá Santos.
Com um jeitão despreocupado, gestos contidos e um tanto quanto disperso [interrompe a entrevista algumas vezes para atender ao telefone e diverte-se ao falar sobre assuntos totalmente fora do contexto] o baiano recebeu a reportagem do
A Tarde On Line e contou sobre infância, família, trabalho e a produção do filme baseado na sua biografia. Sua vida não foi fácil e os percalços o fortaleceram. Filho de família pobre, estudou até a 4ª serie em um colégio público do bairro, Leopoldo dos Reis. Abandonou os estudos aos 14 anos para seguir a carreira de boxeador, com o incentivo de um dos seus 16 irmãos, Luis Cláudio. Passou fome, dormiu no chão, chegou a arriscar como carpinteiro, mas não desistiu da paixão pelos ringues.
Lutou profissionalmente pela primeira vez aos 19 anos e mostrou, na estréia, a pegada forte que o consagraria como o maior boxeador do Brasil. Derrubou o adversário Adriano Soares em 24 segundos. A partir daí, surgiram convites para novas disputas e outros 28 jogos tiveram o mesmo destino. Com eles, arrematou os cinturões de Campeão Mundial pela WBO 2004 (Leve), Campeão Mundial pela AMB 2002 (Super Pena), Campeão Mundial pela WBO 1999 (Super Pena) e recentemente Campeão Mundial Leve pela WBO.
Popó olha para trás sem ressentimentos. Orgulha-se da origem pobre e das dificuldades enfrentadas para alcançar vitórias importantes e estabilidade financeira. Emociona-se ao rememorar a época que faltava dinheiro em casa para comprar o básico e considera-se iluminado pela ajuda aos parentes. Comprou imóvel para mãe, Dona Zuleica, e presenteou os irmãos com a Academia Popó Mão de Pedra.
Hoje não falta comida, mas ele não pode exagerar à mesa. Popó trava uma luta três meses antes de cada competição para perder 10 quilos echegar ao peso da sua categoria [leve, de 59 a 62 kg, no máximo]. Muda a alimentação e treina pesado na academia da Baixa de Quintas com o incentivo do atual treinador, Ulysses Pereira, também técnico da seleção olímpica brasileira. Antes dava o peso certo porque não tinha o que comer, agora tenho e não posso...risos. Recupero tudo em minutos. Evito doce porque é pior do que o prato de feijão da minha mãe, diverte-se.
Saiba mais sobre o filme
A história do garoto pobre que se transformou no maior pugilista de todos os tempos do país vai ganhar as telonas. Dirigido por Giovani Lima, com roteiro de Marcos Bernstein (Central do Brasil, Terra Estrangeira, Xangô de Baker Street e do Outro lado da Rua), o filme será produzido pela Malagueta Filmes, em parceria com a Boxe Brasil, e deve ser lançado em um ano. A direção de fotografia fica por conta de Marcelo Brasil (O Dique, Central do Brasil, Notícias de uma guerra particular, Red Shoes Diaries e Orquídea Selvagem).
As gravações serão baseadas no depoimento de familiares, amigos e companheiros e devem ser iniciadas em seis meses. Imagens de arquivos das competições podem ser introduzidas. O filme vai começar perfazendo um pouco da trajetória do pai, que também flertou com o esporte e sustentou a família como apontador de jogo do bicho. Podemos dizer que ele foi responsável por plantar a sementinha do boxe, justifica Giovani Lima.
Os obstáculos da vida do pugilista, a exploração, os contratos mal feitos vão ganhar destaque no filme produzido para divertir e emocionar os espectadores, como ocorreu com o recente Dois filhos de Francisco sobre os cantores Zezé Di Camargo e Luciano. Iremos fazer um trabalho para entreter, de fácil aceitação. Seguindo o modelo do filme de Breno Silveira e do nível de a Luta pela Esperança, com Russell Crowe, explica o diretor.
A relação com o primeiro técnico, Dórea, também será mostrada. A produção vai omitir, no entanto, a questão do acordo contratual que causou o rompimento entre o instrutor e o pugilista. Dórea afirma que Popó o traiu. O pugilista defende-se: No acordo, ele recebia 75% de tudo. Aceitei porque era ignorante e desconhecia meus direitos. Fui alertado e sugeri a divisão do cachê em 50% para as duas partes. Como rejeitou, nos separamos.
A carreira terá atenção especial para valorizar o boxe e mostrar a evolução do pugilista, com cenas sobre as principais lutas e a única derrota, quando perdeu por nocaute técnico no 10o round para o americano Diego Chico Corrales. Podemos fazer a parte dois do filme para mostrar a revanche contra Corrales, disse, confiante em uma vitória sobre o adversário que o derrubou nos EUA.
O filme também vai levar para o cinema o Popó conhecido do grande público. A fera dos ringues que chora copiosamente quando lembra dos tempos difíceis na Baixa de Quintas. O homem humilde que deu uma reviravolta e não tem vergonha de assumir seu semi-analfabetismo. O atleta simples que se diverte do inglês capenga [falo em ingleeis com os caras (adversários)] e das próprias garfes. Com esse filme, vou é para Guiness (Book) [diretor corrige: É Cannes, Popó]. Ah, desculpa, aquela cidade que premia os melhores do cinema é Cannes, não é? Então, é lá mesmo. Estou doido para ver aqueles caras com pedaços de pão embaixo do braço, comenta, aos risos.
Leia o roteiro do filme
A idéia de fazer o filme baseado na saga de Popó surgiu há dois meses. A Malagueta contatou o pugilista, que aceitou sem pestanejar. Outras empresas haviam me procurado para fazer um documentário e não concordei porque sempre desejei fazer algo maior, que trouxesse mais detalhes sobre a minha profissão e batalha para vencer, destacou.
Enquanto as gravações não começam, os produtores estão em busca de patrocínio e já inscreveram o filme, que ainda não tem título, no Ministério da Cultura. Popó é uma figura conhecida e muita querida. Acredito que será fácil encontrar parcerias, empresas interessadas em investir nessa empreitada, afirma Giovani Lima.
O processo de pesquisa já começou. A produção entrou em contato com todos as pessoas mais próximas de Popó para colher informações suficientes para enriquecer a história. Estamos procurando máximo de dados para o longa. Popó é conhecido em todo o país e queremos contar a sua história emocionante para todos. Ele tinha tudo para dar errado, mas se destacou no esporte e deu uma guinada, emenda Lima.
O elenco ainda não foi definido e ainda não há informações sobre número de atores e figurantes que estarão envolvidos no processo. A produção está ciente, no entanto, que o protagonista deve ser, no mínimo, um típico galã das telas. Tem que ser tão bonito quanto eu, exige o baiano.