Com ilustrações de Esteban Vivaldi, livro foi lançado neste domingo no YouTube | Foto: Rafael Martins | Ag. A TARDE
Uma das frases preferidas do psicólogo e consultor em educação Alessandro Marimpietri é: “Cada decisão tomada traz, ao mesmo tempo, aspectos positivos e negativos”. E mais do que nunca isso ganha força quando a pergunta que não sai da cabeça de pais e mães é: quando e como devem ser retomadas as aulas presenciais dos filhos?
Com doutorado sobre o fracasso de modelos escolares, pela Universidade Nacional de Cuyo, na Argentina, Marimpietri tem testado constantemente o impacto de decisões cotidianas desde o início da pandemia, em março do ano passado, ao alinhar seus pensamentos sobre o papel das escolas, o atendimento a crianças e as necessidades efetivas de seu filho Lucca, de 8 anos, com quem passou a conviver muito mais intensamente desde o início da quarentena.
Parte das reflexões sobre os seus objetos de estudo, anteriores à pandemia, deveriam ter gerado um livro teórico sobre a educação de crianças, que nunca saiu por falta de tempo de Marimpietri, que, em suas palavras, “sempre trabalhou muito”.
A parada forçosa e a experiência intensa da paternidade criaram no psicólogo a necessidade de escrever diretamente para o seu filho. Pequenos textos, declarações de amor relacionadas à convivência dos dois.
“Uma amiga leu por acaso e achou interessante que pessoas que cuidam de crianças tivessem acesso a esse material”, afirma Marimpietri, explicando como surgiu Quando somos um só, livro que foi lançado neste domingo, 21, com ilustrações do também pai de uma criança, Esteban Vivaldi, às 18h30, pela Solisluna, no canal do YouTube da editora.
Em 26 páginas, para serem lidos por crianças e familiares, pequenos textos expõem os sentimentos do pai em diferentes situações: o medo que acompanhou a alegria da notícia de que seria pai, a sensação de ser ninado e outras gentilezas e afetos selecionados entre tudo o que os dois têm vivido nesse período atípico em que o pai não passa a maior parte do tempo no consultório.
Contato
Uma parcela da inspiração para os textos veio com a observação do sofrimento do filho, que até outubro do ano passado morava com os pais em um apartamento e sentiu dramaticamente a perda da escola, do contato com os amigos, as visitas de familiares, o ar livre.
“Ao mesmo tempo, tem a possibilidade de entre um atendimento e outro dar um beijo nele, ver o que está fazendo. Vivemos coisas muito duras e coisas muito boas, todas elas superlativadas pela experiência do confinamento”, diz.
O psicólogo que se especializou em crianças muito antes de ter o seu próprio filho está aprendendo outros aspectos da paternidade graças a uma quarentena que também lhe exige a busca de respostas desafiadoras para os seus pacientes infantis e clientes gestores de escolas.
Quanto à decisão de voltar ou não às aulas, por exemplo, Marimpietri declara: “Não tenho habilitação para opinar sobre o retorno ou não das aulas, não sou epidemiologista. Mas, na condição de alguém que milita na saúde mental, posso dizer sem medo de errar que um ano inteiro para crianças e adolescentes fora da escola é devastador”, pondera.
Ele sublinha que na impossibilidade de se ter a escola viva, a escola remota é um mal necessário que mantém vivo na criança o ato de aprender, de participar de uma comunidade.
“A escola não é um prédio, precisa de boas instalações, mas é muito mais do que isso. A gente não pode reduzir a potência de colocar crianças regidas por uma mesma lei simbólica, que estão ali para interagir, trocar afetos. Nessa condição é que se produz a aprendizagem”.
Para ele, em um uma epidemia não existe escolha boa e toda escolha implica perda. “Diante dos novos dados obtidos pela ciência quanto à transmissão em crianças, que as autoridades avaliem um retorno seguro, uma vez que não ir à escola é muito danoso para as crianças”.
Marimpietri também defende que nos protocolos de saúde para a volta às aulas seja incluída a saúde mental, com entendimento sobre os níveis de estresse. “Se a gente não fizer um acolhimento das crianças, das famílias, dos agentes socioeducativos, não haverá teto para adesão ao protocolo”.
Sobre os desgastes provocados em muitas famílias pela convivência forçada por um longo período, o psicólogo destaca que entre pais e filhos, assim como em qualquer relação humana, cabe tudo.
“Tem cansaço, vontade de não querer ver, alegrias, tem tudo. A gente não pode mitificar a relação entre pais e filhos como se fosse sublime. Então, imagino que há muito cansaço”, afirma.