“Faltam homens éticos tanto na política como na economia que estejam sinceramente atentos ao bem comum”, advertiu na quarta-feira, 8, o papa Bento XVI, em clara alusão aos líderes mundiais reunidos, em Áquila (Itália), por ocasião da cúpula do Grupo dos Oito países mais ricos. Ou seja, sem vontade política e visão de futuro dos líderes dos países mais poluidores do planeta (encabeçados agora por China e EUA), o novo protocolo de mudanças climáticas não terá força suficiente para deter o contínuo aquecimento global, cujas consequências são ainda imprevisíveis e subestimadas. Ele substituirá o de Kyoto (ratificado, em 1997, por 192 países), entre 2012 e 2050.
Mesmo num cenário desastroso de crise econômica mundial, onde criação de empregos e retomada do crescimento são imprescindíveis, não se pode a pretexto destes objetivos parar de avançar na pesquisa tecnológica para substituição de combustíveis fósseis, como carvão e óleo, oriundos da Revolução Industrial, do final do século XVIII. Outra solução a ser ainda verificada em larga escala é o mercado de compra de carbono. Caso contrário, será tarde para se evitar possivelmente a chamada catástrofe ecológica.
Segundo cientistas do Painel de Mudanças Climáticas da ONU (ipcc.ch), medições da superfície da Terra atestam que desde 1970 as temperaturas aumentaram em 0,4 centígrado. Baseadas em programas computadorizados ainda em fase de teste, as previsões apontam para crescimento de 4 centígrados até 2100, se as médias atuais se mantiverem. O que significa efeitos consideráveis sobre cultivo agrícola, disponibilidade de água, variações climáticas causando secas, tempestades, furacões, dependendo da região, além de aumento mais rápido do nível dos oceanos com o derretimento de geleiras da Groenlândia e Antártica Ocidental, assim como extinção provável de faunas e espécies animais.
É pouco? Vale a pena assistir ao esclarecedor documentário Verdade inconveniente, de Al Gore, ex-vice-presidente americano.
EUA, Rússia, Japão, Alemanha, França, Grã-Bretanha, Canadá, Itália, China, Índia e Brasil, entre outros, são responsáveis por mais de 80% das emissões de gases, como o dióxido de carbono e metano. E por isso têm sérias responsabilidades a cumprir desde a primeira Conferência de Clima (Rio, 1992), incluindo as que foram sugeridas anteontem, como a redução de emissão de gases provocadores do efeito estufa na ordem de 80% para os países mais industrializados e em 50% para os demais, antes de 2050. Tais metas se comparam aos níveis de 1990 e limitam o aquecimento da temperatura a 2 graus centígrados.
Apesar da resistência de Índia e China, os EUA, sob a forte liderança de Barack Obama, devem ratificar o novo protocolo, numa mudança radical de postura em relação ao seu antecessor, George W. Bush, contrário à redução de gases por entender que isto prejudicaria o desenvolvimento industrial. Mas Obama defendera a progressiva substituição dos atuais processos industriais por energias mais limpas (como energia solar) e menos gastadoras de combustíveis. Uma das suas condições para salvar financeiramente as montadoras em falência era justamente que fossem menos “beberronas” de gasolina. A briga é de “cachorro grande”, porque, por sua vez, a China, atual recordista em poluição devido ao seu acelerado crescimento, argumenta, assim como Índia e outros países em desenvolvimento, que têm direito e dever de se desenvolver. Historicamente, EUA e Grã-Bretanha têm maiores percentuais de emissões de gases.
A cúpula de Áquila (recentemente destruída por devastador terremoto) joga nas mãos dos líderes a decisão de fixar novas bases de desenvolvimento sem agressão sistemática do planeta. Resta saber se até a cúpula de Copenhague (7 de dezembro), eles terão força e habilidade para vencer, nestes tempos de verbas escassas para investimento, os lobbies industriais e empresariais, para restabelecer novos parâmetros de sustentabilidade e de uso racional das energias compatíveis com as capacidades naturais e finitas do planeta. Estimativas sugerem fundos adicionais de US$ 150 bilhões anuais para auxiliar esta tarefa.
Mas a Terra não pode esperar. Seria puro egoísmo e ingratidão deixá-la suja e poluída para as novas gerações.
Ranulfo Bocayuva l Jornalista, diretor-executivo do Grupo A TARDE. E-mail: rbocayuva@grupoatarde.com.br