Pode até ser simples demonstração de força do tipo “cão que late não morde”, mas o fato é que as manobras navais do Irã (com direito a testes de míssil) no Estreito de Ormuz, via de escoamento de 17% da produção mundial de petróleo no Golfo Pérsico, já causaram aumento de até 4% do preço do barril Brent (Mar do Norte), chegando a US$ 113, 7, conforme a revista britânica “The Economist”.
Além disso, o enfrentamento teatralizado por ameaças verbais feitas aos americanos reacende o fantasma da guerra entre Irã e Iraque nos anos 80, quando os iranianos atacaram instalações petrolíferas ocidentais no Golfo Pérsico, além de terem colocado minas para bloquear a passagem de navios. Nada disso é conveniente em meio às crises econômicas, na Europa e Estados Unidos, e tentativas de recuperação mundial.
As pressões econômicas europeias e americanas estão tentando estrangular a capacidade econômica do Irã, cujas receitas do petróleo representam 80% do total. A situação é perigosa na medida em que as chances diplomáticas de diálogo estão se esgotando com o regime do presidente Mahmoud Ahmadinejad, tradicionalmente isolado e suspeito de desenvolver programa nuclear para fins bélicos.
O pior que é não há realmente interlocutores confiáveis à altura para intermediar tais divergências até o presente momento.
Segundo relatório da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), com sede em Viena, os iranianos já produziram 73,7 quilos de urânio enriquecidos a 20%, supostamente destinados para fins médicos, mas que poderiam ser também utilizados para fabricação de bomba nuclear.
Mesmo criticando os EUA, que armazenam cerca de cinco mil bombas nucleares, o Irã não deveria temer as inspeções que comprovariam que seu programa tem objetivos pacíficos.
Como reação à falta de esclarecimentos por parte do Irã sobre seu programa nuclear, os europeus anunciaram para fevereiro o embargo às exportações do petróleo. Washington já havia proibido que empresas estrangeiras obtivessem acesso ao sistema financeiro americano, caso negociassem com o Banco Central do Irã, responsável pela maioria das transações comerciais com petróleo. Ou seja, o Irã, que é o quinto país exportador de petróleo para a Europa depois de Rússia, Noruega, Líbia e Arábia Saudita, poderia efetivamente fechar o Estreito de Ormuz, de 54 quilômetros, e paralisar as exportações de petróleo na área.
Mas pode ser também um suicídio estratégico, porque asfixiaria completamente sua capacidade econômica e militar, conforme tese do professor de Segurança Nacional da Escola Naval de Rhode Island, Nikolas Gvosdev, divulgada pela Agência Reuters.
Apesar das garantias de estoques de petróleo de grandes importadores, como EUA, Europa e Japão, que poderiam suprir faltas temporárias de abastecimento, o eventual bloqueio afetaria principalmente as exportações da Arábia Saudita, maior produtor mundial, além do Kuwait e Iraque.
A cada ameaça militar iraniana o mundo treme porque sabe que está lidando com emergente potência nuclear afinada com Hezbollah e Hamas, apesar de enfraquecidos por causa das revoltas populares na Síria, conhecido patrocinador destes grupos terroristas.
Além disso, o Irã também é rival de Israel e Arábia Saudita, aliados convencionais dos ocidentais por razões históricas e comerciais. A novidade é que no Iraque, onde se esperava estabilidade política após dez anos de ocupação americana, reina a guerra civil com predomínio crescente dos grupos xiitas alinhados com Teerã.
Oxalá tivéssemos interlocutores capazes de iluminar com bom senso e equilíbrio divergências entre blocos de poder. O acirramento de tensões com base em desconfianças sedimentadas só provocará mais insegurança num mundo onde o poder da diplomacia se reduz infelizmente cada vez mais. As agências internacionais têm a obrigação de recriar com credibilidade e independência este diálogo no seio da comunidade como única solução de consenso e arbitragem.