Osama Bin Laden deve estar rindo à toa, se é que está vivo. A crise imobiliária, que se transformou em terremoto financeiro e bancário, após a concordata de bancos e seguradora com secular tradição de solidez, nos Estados Unidos, arrastou o mundo para cenário de incertezas e indagações sobre a lógica do capitalismo atual. Uma delas remonta ao 11 de setembro de 2001, quando o líder da rede terrorista Al-Qaeda afirmou que os ataques haviam “atingido o coração da economia americana”. Mais do que isso. Como principal economia de mercado, as conseqüências desta crise se refletiram rapidamente na queda das bolsas no mundo todo.
Ele estava assustadoramente certo: os resultados do 11/9 não somente desencadearam a fracassada guerra no Iraque e Afeganistão, a perda de mais de US$ 140 bilhões para o setor do turismo, a eliminação de liberdades civis (um dos pilares mais fortes da democracia), como também levaram ao descontrole na concessão de créditos. Estimava-se que esta era uma forma de se estimular a economia americana por meio de financiamento da casa própria a clientes de baixa renda, ou “subprime”. O grave erro, que acabou provocando a estatização dos dois gigantes do crédito hipotecário Fannie Mae e Freddie Mac por US$ 200 bilhões, dos bancos Lehman Brother e Merrill Lynch e da seguradora American International Group (AIG), coloca em questão a regulamentação financeira, ou seja, as normas de fiscalização e funcionamento do sistema financeiro.
Outra explicação para esta crise de excesso de créditos é, possivelmente, a elevada remuneração dos dirigentes destas instituições. “Os bancos de investimentos tentaram a qualquer custo manter rentabilidades elevadas para justificar as remunerações excessivas de seus dirigentes, concedendo créditos exageradamente”, diz o economista Daniel Cohen ao jornal “Le Monde”. Stanley O’Neil embolsou, por exemplo, US$ 100 milhões, em outubro de 2007, antes de ser afastado da presidência do Merrill Lynch.
Uma das principais constatações a que podemos chegar, a dois meses das eleições presidenciais americanas, é que, mesmo sem sabermos se Bin Laden está vivo ou morto, sua rede continua atuante e com novos seguidores. No mesmo dia em que os bancos centrais dos EUA, União Européia, Suíça, Reino Unido, Austrália, Índia e Japão se juntavam num esforço inédito emergencial para injetar mais de US$ 350 bilhões para evitar a contaminação sistêmica, militantes da Jihad Islâmica (simpatizante da Al Qaeda) atacavam a embaixada americana, em Sana, Iêmen, causando a morte de 16 pessoas. Citado pela revista “The Economist”, o próprio comandante americano Mike Mullen admitiu no Congresso americano que não estava convencido da vitória de suas tropas no Afeganistão contra os talibãs. Na fronteira do Paquistão, importante aliado dos EUA, os redutos da Al-Qaeda continuam sendo atacados, mas sem sucesso.
Especialistas na luta antiterror afirmam que a coordenação de serviços de inteligência e espionagem pode trazer resultados mais eficazes contra pequenos grupos e células, como Al-Qaeda, que opera em diversos países. Estes fatos reforçam a argumentação de que tanto as políticas econômicas, como as de segurança nacional ajudaram a afundar, nestes últimos sete anos, a maior potência mundial em vez de reconduzi-la a um patamar de liderança.
O colunista do “New York Times”, Paul Krugman, autor do livro “A desintegração americana”, explica que, assim como a guerra no Iraque, a política econômica de Bush se tornou inócua. “Como é que alguém pode explicar a decisão insólita de diminuir a receita do governo num momento de necessidade fiscal e inundar de benefícios a classe rica numa época de guerra? Os cortes de impostos para os ricos não fizeram nada pela economia: apesar de alguns sinais de vida no mercado de trabalho, Bush vai terminar seu mandato com o pior desempenho em matéria de empregos desde Herbert Hoover, ao mesmo tempo em que acumula dívidas”, critica Krugman.
O fracasso do governo de direita radical deixa espaço para o candidato democrata Barack Obama ganhar as próximas eleições americanas. Mas resta saber se ele terá, além da retórica demonstrada na campanha, equilíbrio e seriedade para recolocar nos trilhos a maior potência mundial nestes novos tempos de turbulência.
* Ranulfo Bocayuva é jornalista e diretor-executivo do Grupo A TARDE