Deputado José Carlos Araújo (PR-BA), presidente da Comissão de Ética da Câmara Federal
O deputado federal José Carlos Araújo assumiu a presidência do PR-BA com o objetivo de restruturar a legenda e mantê-la na base do governador Rui Costa. Mas sua principal batalha é fazer andar o processo de cassação do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) na Comissão de Ética da Câmara. Tenta usar as mesmas armas regimentais que Cunha usa para retardar o processo para anular as manobras escusas do presidente da Casa.
Qual o calendário da Comissão de Ética?
Nós tínhamos 90 dias e um mês a partir de 3 de novembro para fazer o processo (de admissibilidade de quebra de decoro contra o deputado Eduardo Cunha). Levamos cerca de três meses para fazer a admissibilidade, ao contrário da rapidez do processo de impeachment da presidente Dilma. Isso porque ele (Cunha) usou e abusou de todas as prerrogativas que tinha e que não tinha para atrasar. Atrapalhou, fez o processo voltar, me fez trocar o relator, o que não tinha necessidade. E agora fez um projeto de resolução na calada da noite onde quer mudar a composição partidária e acabar com o Conselho de Ética.
Como assim?
A composição feita no começo da legislatura é a que vale. Mas se isso fosse o pé da letra não se sustentava. Isso porque no começo da legislatura, se faz um "blocão" (entre os partidos) para poder se obter mais cargos nas comissões. No entanto, dois três dias depois se acaba o "blocão" após a divisão das comissões.
O que passa a contar é o número de deputados eleitos por cada partido.
Isso. Aí se fazem os blocos partidários para atuar em plenário. Na composição das comissões, o relator não pode ser do mesmo partido e estado do presidente. No caso da Comissão de Ética, foi escolhido o (Fausto) Pinato (PRB-SP). No meio do processo, Cunha veio com uma pérola, alegando que Pinato era do "blocão" e não podia ter sido nomeado relator. Então, ele deu uma "canetada" mandou o primeiro-vice me "canetar". Ele queria que eu fosse à Justiça, pois o processo iria demorar mais ainda. Reuni os deputados e escolhi novo relator (Marcos Rogério PDT-RO). Ele absorveu o relatório antigo.
Foi uma contramanobra?
Sim. O regimento da Casa diz que se o novo relator acatar o antigo relatório e fizer pequenas mudanças não é preciso começar do zero nem votar de novo. Foi o que aconteceu. Aí ele (Cunha) deu outra "canetada" e me obrigou a colocar novamente em votação, que foi aquela que ocorreu de madrugada.
Por que foi necessário votar de madrugada?
Outra manobra de Cunha que tive que contornar. Ocorre que quando eu marcava uma sessão do Conselho de Ética, ele marcava uma sessão extraordinária no plenário da Câmara. Quando começa a ordem do dia, tenho que interromper a sessão no Conselho. Nessa sessão, ele começou a ordem do dia às 17 horas. Eu tive que comunicar e suspender a do Conselho até acabar a ordem do dia. Eu sabia que Cunha tinha que encerrar a sessão até a meia-noite. Quando deu 20h30, a matéria que tinha que ser votada no plenário foi votada. Então, Cunha chamou os líderes aliados dele que começaram a discursar. Às 22 horas só tinha quatro deputados no plenário. Por volta das 23 horas só tinha Jovair Arantes, que havia falado três vezes. Não teve jeito, ele encerrou a sessão.
Aí o senhor recomeçou a sessão do Conselho...
E fiz um jogo. Aí que ele se ferrou. Peguei dois deputados e mandei eles se esconderem, um deles o Pinato. A turma de Cunha apresentou quatro requerimentos para adiar a sessão, mas alguém falou que a bancada contra Cunha tinha menos dois votos. Então, após eu "cantar" o relatório da admissibilidade, os requerimentos foram retirados, pois eles pensaram que tinham voto para rejeitar. Chamei os dois deputados. Um já estava no seu lugar e o Pinato ficou no meio dos jornalistas, despercebido. Coloquei em votação. Todos votando e eles cantando vitória. Eu chamei Pinato: o senhor já votou? Não, presidente, vou votar. Aí deu empate, 10 a 10. E o voto de minerva ficou para mim. Foi aí que votei pela admissibilidade para o deputado Eduardo Cunha poder "provar a sua inocência".
A estratégia do senhor é usar o próprio regimento, sem judicializar, para derrotar as manobras de Cunha?
Exatamente. Se for para a Justiça, vai atrasar ainda mais. Eles usam muito a "questão de ordem" para retardar as sessões. O que faço? Peço que façam por escrito e como não tem prazo para eu responder, consigo anular essa manobra protelatória.
A próxima fase é a de ouvir as testemunhas.
Ele (Cunha) indicou oito testemunhas, o relator e o partido que entrou com a representação também já indicaram. São ao todo 19. O curioso é que Cunha entrou com mandado de segurança para não ouvir as testemunhas do relator, entre elas Leonardo Meireles, operador, sócio de Alberto Youssef. Na semana passada fui a Curitiba conversar com o juiz Sérgio Moro. Cinco testemunhas de acusação estão presas. Moro disse que não tem nenhum problema ouvi-los, mas, como Cunha tem foro especial, recomendou que eu pedisse autorização ao STF. Falei, então, com o ministro Teori Zavascki, que igualmente não causou qualquer dificuldade. Acertamos promover as oitivas na Assembleia Legislativa do Paraná, inclusive porque lá os aliados de Cunha vão ficar mais intimidados para pressionar as testemunhas. Devemos fazer essas oitivas na próxima semana.
Mas o Leonardo Meireles foi ouvido?
Sim, em Brasília, e ele, que fez delação premiada, falou que, numa das quatro operações para transferir dinheiro de propina feitas por Youssef, o Youssef disse ter entregue em espécie numa mala de dinheiro no endereço de Eduardo Cunha, na Barra da Tijuca, no Rio.
E os documentos do Banco Central?
Semana passada, integrantes do Banco Central levaram um dossiê de 400 páginas onde deixa claro e cristalino que Eduardo Cunha tem contas no exterior. Tanto é verdade que o BC está multando ele em R$ 1,125 milhão, o que equivale a dez contas no exterior. Aí, ele entrou com o mandado de segurança para que a gente não ouvisse as testemunhas alegando que elas não tinham nada a acrescentar. Ora, é ele que determina isso? Quebrou a cara, porque a ministra Cármen Lúcia negou.
Cunha corre o risco de não ser afastado antes da presidente Dilma, caso o Congresso aprove o impeachment?
O prazo do relator apresentar o relatório sobre a cassação de Cunha acaba em meados de maio, lá pelo dia 16.
Essa semana haverá sessão da comissão?
Sim. Na quarta, em face dos documentos que têm chegado, que informam muita coisa que a gente queria saber das testemunhas, graças aos depoimentos nas delações premiadas que nos foram disponibilizados pelo juiz Moro, faremos uma sessão para dispensar algumas testemunhas.
O senhor pergunta aos ministros do STF por que o caso de Cunha não anda lá, já que ele foi denunciado pelo procurador Rodrigo Janot há algum tempo?
Me disseram lá (no STF) que são instâncias diferentes, o Supremo e o juízo de primeira instância (de Sérgio Moro).
Tem recebido ameaças ou tentativa de suborno em função de enfrentar Eduardo Cunha?
Algumas pessoas dele vêm conversar comigo, mas não tem como provar. Um disse que eu "poderia estar resolvendo o assunto de outra maneira", que eu vou "precisar de ajuda" nas próximas campanhas. Foi um amigo comum. Eu disse que iria fazer de conta que não ouvi. Outro lembrou que Cunha é perigoso, é do Rio, tem ligações com milícias... Respondi que já cheguei aos 70 anos, estou no lucro.
Como o senhor vai votar em relação ao impeachment da presidente Dilma Rousseff?
Não vou revelar ainda. Se eu disser que sou contra, ele (Cunha) vai dizer que minha posição decorre de ele ser a favor. Se eu disser que sou a favor, vai dizer que eu estou "jogando a toalha". Estou entre os indecisos, só vou dizer na votação. Por outro lado, Cunha é o terceiro da linha sucessória. Se cassam Dilma e Temer assumir e precisar viajar, Cunha vira presidente. Aí vou ter que pedir asilo político...
Como está sendo enfrentar Cunha nesses meses?
Ele é um sujeito muito inteligente, tinhoso. Mas eu também conheço muita coisa do Congresso, algumas aprendi inclusive com ele.
Tratando da política na Bahia. Há um bizu de que o senhor mudou do PSD para o PR para ser candidato a senador (em 2018). É verdade?
Não.
O que motivou a troca de partido?
A direção nacional do PR procurou o ministro Jaques Wagner e o governador para dizer que estava com dificuldade de manter o PR na base de Rui Costa. E mostrou vontade de ter um deputado na direção do partido na Bahia e me indicaram. Por quê? Já tinha sido presidente do PR e peguei o partido com um deputado federal, deixei com seis, mais cinco deputados estaduais e 43 prefeitos. Agora recebi o PR com dois deputados federais, sendo que um deles, José Rocha já saiu, e onze prefeitos. Estou tentando dar uma reestruturada no partido para que nessa eleição municipal de 2016 consiga fazer 30 a 50 prefeitos e tenho candidato a prefeito em Salvador.
Quem é
João Henrique (ex-prefeito, que governou por dois mandatos).
E a Justiça Eleitoral vai deixar (ele tem quatro contas rejeitadas)?
É o nosso candidato. Se vai deixar ou não, aí é outra batalha. E temos candidatos também nos grandes municípios.
Não vai haver composição do PR em Salvador, com os candidatos da base do governador Rui Costa?
A princípio não. Vai ser uma candidatura independente, mas é claro que estou querendo o apoio do governador.
Como o senador Otto Alencar reagiu a sua saída do PSD?
Ele não queria que eu saísse. Mas o líder do PSD na Câmara (Rogério Rosso - DF) fez um deputado renunciar da Comissão de Ética e colocou um outro deputado do bloco de Cunha para votar a favor dele. Ou seja, não me prestigiou, não me consultou. Então, procurei o PR para saber se a proposta ainda estava de pé e mudei de partido.
Alguma negociação para atrair deputados estaduais já que o PR não tem nenhum?
Por enquanto não, pois não tem "janela" partidária agora. É preciso esperar a próxima.
O PR vai reivindicar espaço no secretariado do governo Rui Costa?
O partido está me cobrando isso e eu disse que iria conversar com o governador sobre o assunto, mas só ia depois de restruturar a legenda. Por enquanto não. Não sei quantas secretarias. Quero espaço e vou pedir ao governador e, claro, é como saúde, vou pedir o máximo, quanto puder.