Na Câmara, a avaliação é que a decisão de prender um parlamentar sem considerar os trâmites da Casa é uma afronta à independência e separação dos poderes da República. Foto: Plínio Xavier | Câmara dos Deputados
A prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), determinada na noite desta terça, 16, pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, causou mal estar na relação entre Judiciário e Legislativo. Na Câmara Federal, a avaliação de parte dos deputados é que a decisão de prender um parlamentar sem considerar os trâmites da Casa é uma afronta à independência e separação dos poderes da República.
Silveira foi preso na noite desta terça-feira, 16, após divulgar um vídeo com ameaças a ministros do Supremo e no qual defende o retorno do AI-5, instrumento de repressão mais duro da ditadura militar. No vídeo, o deputado afirma que os 11 ministros do Supremo “não servem para p* nenhuma para este país” e deveriam ser destituídos para a nomeação de “onze novos ministros”.
Após a prisão, o ministro Moraes disse que "medidas enérgicas" são necessárias para impedir a perpetuação da "atuação criminosa" do parlamentar "visando lesar ou expor a perigo de lesão a independência dos Poderes constituídos e o Estado democrático de Direito".
Na tarde desta quarta-feira, 17, em um sinal de unidade da Corte diante do ataque sofrido, o STF decidiu manter, por unanimidade, a decisão do ministro Moraes. No julgamento, os ministros destacaram a legalidade da prisão em flagrante e o caráter de crime inafiançável.
Segundo Moraes, trata-se de hipótese de crime inafiançável, “uma vez verificado que os requisitos possíveis para a prisão preventiva estão presentes”. Moraes afirmou que, nesse caso, “é impossível fiança”.
Buscando apaziguar os ânimos, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ligou para ao menos dois magistrados do STF e afirmou que não quer gerar uma crise entre os Poderes. Segundo Lira, no entanto, os parlamentares temem que, com a prisão, crie-se um precedente perigoso de encarceramento de congressistas, que têm imunidade parlamentar. Para Lira, não há garantia de que o plenário da Casa chancelaria a decisão do Supremo.
Integrantes do tribunal, por sua vez, indicaram que vão ver como uma afronta do Parlamento uma atitude que livre Silveira de qualquer punição. De acordo com os magistrados, é preciso condenar enfaticamente os ataques à Corte.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) considerou como “gravíssimo” os ataques feitos pelo deputado Silveira, mas criticou a prisão do parlamentar, afirmando que prender alguém antes de julgamento deve ser tratado como “grave exceção”
“A Câmara Federal está acima do ato de um parlamentar; o STF acima de uma decisão específica; e o Estado Democrático de Direito acima de todos. O caso do deputado Daniel Silveira deve ser resolvido com procedimentos próprios das duas instituições e à luz da Constituição e da Lei”, escreveu o senador, em suas redes sociais.
“Atentar contra a Democracia e suas instituições é gravíssimo, sujeito ao crivo ético e judicial. Por outro lado, prender ou manter preso alguém antes do julgamento deve continuar a ser tratado como grave exceção”, completou Pacheco.
Corda Bamba
A Câmara dos Deputados votará nesta quinta-feira, 18, em plenário, a manutenção ou a revogação da prisão. A votação é feita por maioria absoluta da composição da Câmara – ou seja, são necessários 257 votos para manter ou para revogar a decisão do ministro Moraes.
Segundo interlocutores congressistas, o presidente da Câmara, Arthur Lira, não quer afrontar o Supremo a fim de evitar uma crise no início da sua gestão. Lira tem debatido com aliados possibilidades.
Uma é costurar um acordo com o Supremo para reverter a prisão do parlamentar. Lira quer convencer Alexandre de Moraes, relator do caso, a substituir a prisão por uma medida cautelar, como a suspensão do mandato. A avaliação da cúpula próxima ao presidente da Câmara, porém, é de que a chance de esse acordo prosperar é baixa.
Lira avalia, também, propor que o caso seja encaminhado ao Conselho de Ética, em um aceno ao Supremo, de modo a punir de alguma maneira o deputado. O presidente não descarta até mesmo articular junto aos pares para confirmar a decisão do Supremo —embora isso seja difícil diante da resistência no Legislativo.
“Absurdo” e “loucura”
Enquanto era levado para a Superintendência da Polícia Federal no centro do Rio de Janeiro, o deputado Silveira afirmou que a decisão que fundamentou a prisão é “louca” e prometeu processar o ministro Moraes assim que deixar o cárcere.
“Não existe flagrante de crime. Não existe crime algum. A decisão é absurda. Não precisa ser jurista para entender que ela é totalmente esvaziada. É uma prisão muito mais política do que jurídica. No momento, sou um preso político”, disse o parlamentar.
Alexandre de Moraes, que determinou a prisão do parlamentar, pura ataques e ofensas contra ministros da Corte a partir do “inquérito das fake news”.
“Em se tratando do Alexandre de Moraes, nada é ilegal né? Nada tem sentido”. “A (minha) prisão não faz sentido”, disse Silveira.
O deputado também disse que não defende o fechamento do STF, e sim a destituição dos atuais ministros, procedimento que não na Constituição de 1988.
“Eu nunca defendi que o Supremo seja fechado. Eu defendi a destituição desses onze ministros e a nomeação de novos onze. E continuo defendendo”, disse.
Expulsão
A direção nacional do PSL-RJ, partido no qual o deputado Daniel Silveira está filiado, decidiu pela expulsão do parlamentar.
De acordo com a gestão executiva da sigla, o parlamentar teria ofendido de "maneira vil" a honra dos ministros do STF. O PSL afirmar repudiar com veemência os xingamentos e ataques declarados pelo parlamentar.
“Os ataques, especialmente da maneira como foram feitos, são inaceitáveis. Esta atitude não pode e jamais será confundida com liberdade de expressão, uma conquista tão duramente obtida pelos brasileiros e que deve estar no cerne de todo o debate nacional”, diz nota divulgada pelo PSL.